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sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Perguntas e respostas: a crise financeira na Europa

Crise do euro

 A Europa, sempre lembrada como uma região de altíssimo desenvolvimento econômico e bem-estar social, agora tem sua imagem associada a turbulências de mercado. Entenda como o descontrole das contas públicas e as particularidades políticas do continente conduziram a zona do euro a uma crise financeira que levará anos para ser totalmente superada.
 
1. Por que a Europa passa por uma crise?
A formação de uma crise financeira na zona do euro deu-se, fundamentalmente, por problemas fiscais. Alguns países, como a Grécia, gastaram mais dinheiro do conseguiram arrecadar por meio de impostos nos últimos anos. Para se financiar, passaram a acumular dívidas. Assim, a relação do endividamento sobre PIB de muitas nações do continente ultrapassou significativamente o limite de 60% estabelecido no Tratado de Maastricht, de 1992, que criou a zona do euro. No caso da economia grega, exemplo mais grave de descontrole das contas públicas, a razão dívida/PIB é mais que o dobro deste limite. A desconfiança de que os governos da região teriam dificuldade para honrar suas dívidas fez com que os investidores passassem a temer possuir ações, bem como títulos públicos e privados europeus.
 
2. Quando os investidores passaram a desconfiar da Europa?
Os primeiros temores remontam 2007 quando existiam suspeitas de que o mercado imobiliário dos Estados Unidos vivia uma bolha. Temia-se que bancos americanos e também europeus possuíam ativos altamente arriscados, lastreados em hipotecas de baixa qualidade. A crise de 2008 confirmou as suspeitas e levou os governos a injetarem trilhões de dólares nas economias dos países mais afetados. No caso da Europa, a iniciativa agravou os déficits nacionais, já muito elevados. Em fevereiro de 2010, uma reportagem do The New York Times revelou que a Grécia teria fechado acordos com o banco Goldman Sachs com o objetivo de esconder parte de sua dívida pública. A notícia levou a Comissão Européia a investigar o assunto e desencadeou uma onda de desconfiança nos mercados. O clima de pessimismo foi agravado em abril pelo rebaixamento, por parte das agências de classificação de risco, das notas dos títulos soberanos de Grécia, Espanha e Portugal.
 
3. Quais países se encontram em situação de risco na Europa e por quê?
Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha - que formam o chamado grupo dos PIIGS - são os que se encontram em posição mais delicada dentro da zona do euro, pois foram os que atuaram de forma mais indisciplinada nos gastos públicos e se endividaram excessivamente. Além de possuírem elevada relação dívida/PIB, estes países possuem pesados déficits orçamentários ante o tamanho de suas economias. Como não possuem sobras de recursos (superávit), entraram no radar da desconfiança dos investidores. Para este ano, as projeções da Economist Intelligence Unit apontam déficits/PIB de 8,5% para Portugal, 19,4% para Irlanda, 5,3% para Itália, 9,4% para Grécia e 11,5% para Espanha.
 
4.Por que o bloco europeu não consegue regular sua política fiscal como os Estados Unidos, por exemplo?
Apesar de ter um órgão responsável pela política monetária, o Banco Central Europeu (BCE), que estabelece metas de inflação e controla a emissão de euros, a União Européia não dispõe de uma instituição única que monitora e regula os gastos públicos dos 16 países-membro. Dessa maneira, demora a descobrir os desleixos governamentais e, quando isso acontece, inexistem mecanismos austeros de punição. Em 1999, os países da região encerraram um ciclo de discussões chamado Pacto de Estabilidade e Crescimento. Em resumo, as nações comprometeram-se com a questão do equilíbrio fiscal. Àquelas altamente endividadas ficou a imposição de apresentar ‘planos de convergência’ para patamares de dívida mais aceitáveis. As sanções seriam recolhimentos compulsórios e multas. Contudo, sua aplicação não seria automática, ficando na dependência de uma avaliação pelo Conselho Europeu. A política mostrou-se insuficiente para controlar os gastos públicos dos PIIGS.
 
5.A crise financeira pode afetar a economia real da Europa?
A desconfiança em relação à Europa pode disseminar pânico no mercado e fazer com que bancos fiquem excessivamente cautelosos ou até parem de liberar crédito para empresas e clientes. Os investidores, ao venderem ações e títulos europeus, provocam fuga de capitais da região. Sem poder provocar uma maxidesvalorização do euro, haja vista que isso prejudicaria aqueles países que têm as contas controladas, a opção é impor sacrifícios à população, como corte de salários e congelamento de benefícios sociais. Tudo isso implica menos dinheiro para fazer a economia girar - justo num momento em que a zona do euro precisa crescer e aumentar sua arrecadação para diminuir o endividamento. O risco é a criação de um círculo vicioso, em que uma estagnação ou, até mesmo, uma recessão, prejudique os esforços de ajuste fiscal - o que levaria a medidas de austeridade ainda mais severas, mais recessão, e assim por diante. Num segundo momento, a Europa, como um dos maiores mercados consumidores do mundo, diminuiria o ritmo de importação de bens e serviços e prejudicaria a dinâmica econômica global.
 
6. Por que o euro se desvaloriza?
A possibilidade de que governos e empresas da região tornem-se insolventes faz com boa parte dos investidores simplesmente não queira ficar exposta ao risco de ações e títulos europeus. Na primeira metade do ano, o que se viu foi um movimento de venda destes papéis e fuga para ativos considerados seguros, como os títulos do Tesouro norte-americano. Tal movimento, de procura por dólares e abandono do euro, fez com que a cotação da moeda européia atingisse valores historicamente baixos. As moedas também refletem o vigor das economias. Assim, argumentam os analistas, a tendência de longo prazo é de fortalecimento do dólar e das moedas dos países emergentes (real inclusive), enquanto a Europa não conseguir resolver seus problemas fiscais e criar condições para um crescimento econômico mais acentuado.
 
7. O que foi feito para evitar a derrocada do euro?
Dois pacotes de socorro foram aprovados com o intuito de ganhar tempo para a tarefa de reorganizar as contas dos países mais endividados e restabelecer a confiança dos investidores na região. O primeiro voltava-se exclusivamente à Grécia e somou cerca de 110 bilhões de euros. O montante, levantado pelo Fundo Monetário Internacional (€ 30 bilhões) e pelos governos dos países da zona do euro (€ 80 bilhões), deve ser liberado de forma progressiva num prazo de três anos. O segundo foi a constituição de um fundo emergencial de 750 bilhões de euros para situações de crise na União Européia. Qualquer país da região estaria apto a recorrer a ele. A maior parte, € 500 bilhões, virá de países europeus e o restante, € 250 bilhões, do FMI.

Mercados mandam um sinal de alerta para a economia real

Economia global já dá sinais de enfraquecimento e mostra que foi atingida pela volatilidade


Bolsa de Nova York (Wall Street)
São Paulo – A volatilidade do mercado financeiro já bate na porta da economia real. Ao redor do mundo os empresários e consumidores estão maios receosos e ressabiados sobre as perspectivas para os próximos anos. “Quedas dramáticas nos preços das ações nem sempre são um prognóstico de uma recessão, mas, na maioria das vezes, elas são”, alerta Steven Barrow, analista do Standard Bank.

Nesta quinta-feira, os investidores deram outra demonstração do quão estão pessimistas com as recentes evoluções sobre uma solução para evitar um calote da Grécia, o que poderia espraiar a crise para os bancos da região, e para tirar os Estados Unidos do marasmo e reativar a criação de empregos. Hoje a taxa de desemprego do país está em 9,1%. No Brasil, por exemplo, o nível de desocupação está em 6%.
A bolsa brasileira despencou 4,83% nesta quinta-feira, aos 53.280 pontos. Em Wall Street também houve pânico. O índice Dow Jones recuou 3,51%, o S&P 500 3,19% e o Nasdaq 100 mais 3,25%. O FTSEurfirst 300, principal índice das ações europeias, recuou 4,6% e atingiu o menor nível em 26 meses. O dólar comercial, após disparar para R$ 1,95 ao longo do dia, terminou cotado a R$ 1,90. E isso tudo aconteceu após o Banco Central americano (Federal Reserve) ter anunciado ontem mais uma medida para reativar a economia.

O problema é que o mercado esperava uma terceira rodada de ajuda ao estilo de um Afrouxamento Quantitativo 3 (QE3), ou seja, a impressão de mais dinheiro. Mas o que a equipe de Ben Bernanke revelou foi a chamada “operação twist”. O mecanismo visa a venda de 400 bilhões de dólares de títulos do governo de até 3 anos e a compra do mesmo montante em notas entre 6 a 30 anos. Apesar de não significar mais dinheiro na economia, a manobra foi desenhada para baixar os juros de longo prazo, o que ajudaria a reduzir também os cobrados em toda a economia, o que poderia dar um estímulo adicional para os consumidores e empresas. Mas a resposta não foi tão boa.

Mohamed El-Erian, presidente da Pacific Investment Management Co., dona do maior fundo de renda fixa do mundo, disse hoje que o mundo está à beira de uma nova crise financeira, com epicentro em dívidas soberanas. O presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick, disse que a economia global está numa “zona perigosa”, e a presidente do Fundo Monetário Internacional, Christine Lagarde, disse que são grandes os “riscos de contração”.

Atividade enfraquece
Os efeitos da crise sobre a confiança do empresariado já podem ser sentidos em todo o mundo. A atividade manufatureira e do setor de serviços na Europa, que mostravam um leve crescimento, passaram a cair em setembro. Os resultados foram os piores desde julho de 2009. No Reino Unido, o indicador CBI mostrou um crescimento de 9% nos fabricantes que informaram pedidos mais fracos que o normal.
Eles citaram “a volatilidade nos mercados financeiros e a desaceleração do crescimento em seus maiores parceiros de negócios”. Nem a China escapou da desaceleração. O indicador de atividade manufatureira do HSBC para agosto, também divulgado nesta quinta-feira, mostrou uma puxada na produção e também nas novas ordens.
O Brasil e a inflação
Por aqui, os economistas dizem que o governo brasileiro tem afugentado os investidores ao reduzir a visibilidade sobre a economia do país, tanto por medidas inesperadas como o corte da Selic, quanto por meio de impostos. O Banco Central, liderado por Alexandre Tombini, pegou todo mundo de surpresa ao tesourar a taxa Selic em 0,5 ponto percentual, que agora está em 12% ao ano.
A estratégia é dar um fôlego adicional para a economia em meio à crise financeira, conforme disse em sua nota publicada ao mercado. O Copom disse que o ambiente internacional irá contribuir para acelerar a moderação da atividade. “Dessa forma, no horizonte relevante, o balanço de riscos para a inflação se torna mais favorável. A propósito, também aponta nessa direção a revisão do cenário para a política fiscal”, diz um trecho do comunicado.
Mas o tiro pode sair pela culatra, principalmente com o efeito da dispara do dólar, que subiu 11% apenas nos últimos cinco dias. “As moedas emergentes tendem a sofrer no curtíssimo prazo, movimento similar ao ocorrido na eclosão financeira de 2008”, afirma Eduardo Velho, economista da Prosper, que não descarta um dólar R$ 2. A pedido de EXAME.com, o analista da Tendências Thiago Curado fez algumas simulações. Se o dólar médio no quarto trimestre for de R$ 2, a inflação oficial pularia para 7,21%.